Foram anos que não esqueceremos tão cedo. Anos seguidos em que o bem-estar de praticamente toda a gente melhorou. Vivemos trinta a quarenta anos a progredir e melhorar. Tudo tinha começado nos anos sessenta para setenta. Depois da adesão à CE, continuámos no mesmo caminho, acelerando. Ultrapassámos a Grécia em rendimento por habitante.
Crescemos, ano após ano, quase sem excepções, mais do que a média da União Europeia. Aliás, se formos mais atrás, entre 1960 a 1990, Portugal foi mesmo o país que mais cresceu. Porém, na década de noventa, as coisas começaram a correr menos bem. E de 1990 a 2000, Portugal já não é a camisola amarela, mas sim a Irlanda. No fim da década, o retrato é ainda mais doloroso: começámos a descair, lentamente, muito menos que a média da União Europeia, deixando que outros países (com menos potencial que nós) nos ultrapasse…em quase tudo. E é provável, que dentro de poucos anos, se distanciem cada vez mais.
No entanto, digam lá o que disserem, progredimos bastante! Adoptámos tecnologias modernas. Temos acesso avançado à Internet. Consumimos telemóveis, dos mais sofisticados, como poucos. Construímos uns largos e belos quilómetros de auto-estradas. Distribuíram-se computadores pelas escolas, repartições e tribunais. Compraram-se os melhores aparelhos do mundo para ressonâncias magnéticas e outras maravilhas do diagnóstico.
Edificaram-se fabulosos hospitais e extraordinários campos de futebol, bem como um Parque das Nações de vanguarda. Integrámos na legislação portuguesa as mais sofisticadas regras de controlo de qualidade. Fizemos nossas as mais complexas normas de saúde pública. Preparamos o “Euro 2004 de futebol”, enfim, estamos na Europa de pedra e cal.
E depois: nos hospitais, espera-se como em nenhum outro país, mesmo se temos mais médicos e hospitais novos. Nos tribunais, as longas esperas de Justiça, têm um remédio, os absurdos adiamentos em recorrer a pena em julgado. No fisco, não se sabe exactamente quantas, mas qualquer coisa como 30 a 40% das empresas não pagam impostos. Aliás, a maior parte dos profissionais liberais não paga (ou não pagava) impostos, ou contribui com uns simbólicos euros para a despesa pública. O trabalho clandestino não cessa de aumentar. A exploração e a fraude de que são vítimas os Africanos e os Europeus de Leste, não tem uma vigilância rigorosa, por parte da Inspecção do Trabalho. Nas Universidades privadas, a formação cultural e científica é duvidosa; nas Públicas, as taxas de abandono e de insucesso são as mais altas da Europa. De vez em quando, deixados subsistir por ineficiência dos serviços de inspecção, descobrem-se autênticos escândalos na qualidade dos produtos alimentares e no cumprimento das regras de saúde e higiene. Não temos Inspectores suficientes…! O País está endividado. As famílias estão empenhadas. As empresas estão na penúria. A facilidade com que se aprovam leis e normas moderníssimas só tem de igual a desatenção prestada aos serviços práticos de organização, produção e inspecção. Ao basbaque que compra e exibe tecnologia é-lhe indiferente que haja quem a saiba utilizar ou sequer que seja útil utilizá-la. Ao legislador exibicionista pouco lhe interessa saber se as leis que aprova são exequíveis e têm os meios de ser postas em prática….!
As vicissitudes da economia e da sociedade portuguesa confirmam um estilo: adiar o que faz falta para fazer o que dá nas vistas.
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